desfilam na passeata apertada
desse trem apertado
aquele tempo lacuna
que exige corpo dentro do vácuo
aquele tempo fatia
que necessita ser consumido mesmo azedado
aquele tempo cronômetro
que otimiza o agora sem nem acabar o anterior
aquele tempo dinheiro
que monetiza o não saber do porvir
enquanto esses tempos passam
meu tempo fica
como caiçara em cidade grande
conta seus peixes, seus grãos
um a um
passando essa preguiça
de gente do
litoral
meu tempo pede um tempo
pra poder respirar
em meio a esses tempos afobados
precisa ver correr um tempo pouco
pra se perceber só
só um tempo
um pouco de tempo
destes de esperar o ponto certo chegar
deixar o hoje morrer
preparar o amanhã para
chegar com calma
com tempo
com a calma de ter tempo
O amor acaba.
Mesmo que dure uma vida inteira,
um dia ele acaba.
Um jogo de futebol acaba
assim como o amor acaba,
com direito a mesa redonda
(aquele na da televisão
e este na do bar mais próximo)
reavaliando lances
com fofocas triviais
sobre quem bebeu caipisaquê demais
antes de um clássico
ou no aniversário da sogra.
Quando o amor acaba,
ele não dá aviso prévio
nem cobra seguro desemprego.
Ele simplesmente sai sem ser visto,
exatamente como a arrumadeira
de um quarto qualquer o fez agora,
enquanto você lia isto.
Quando o amor acaba,
ele não vai de moto, carro ou jato.
O amor domina tecnologias
impensáveis para nós!
Tecnologias que ainda só não descobrimos
porque estávamos nos acabando de amar
um amor sempre por acabar...
Quando o amor acaba,
ele se teletransporta
sabe-se Deus para onde,
mas é tão longe, tão longe,
que sempre nos dói muito
buscar o reencontro.
O amor é um potinho de Nutella
guardado por dois
só para os dois,
e, como tudo que leva Nutella,
um dia ele acaba.
O amor acaba
igual a um jogo de futebol
que acaba.
estou nessa estrada de barro batido
sustentado por um par de chinelos já marrom
olhando para o resto do caminho
cogitando o que vem depois da curva
escondida pela praga surgida no pasto
com meu passo calmo a levantar poeira vermelha
com a delicadeza do respeito ao chão
ao lado
buzinas e motores
voam a se perder de vista
numa via expressa
seguem rumo a lugar nenhum
a atormentar
o canto do pássaro que eu ouvia
Vou nadar até ali,
encostar no quebra-mar
pra ver o pôr do sol,
guardando uma braçada
pra cada dia que nos trouxe
até esta praia
cheia de cascalhos
no lugar de areia fofa.
Vou sem pensar na volta,
contando com a câimbra
na batata da perna direita
para me afogar de vez.
Fazer-me virar manchete
para os jornalistas.
Fazer-me virar lenda
para os amantes.
Um homem só.
Um avião só.
Um corpo só.
Um maquinário só.
Uma queda só.
Uma viagem só.
Um desencontro só.
Um encontro só.
Nós
a sós
pelo mesmo ar