Hortinha

Escrevi teu nome
num grão de arroz.
Plantei teu nome
no pote de algodão,
juntinho do meu
num grão de feijão
para vingarmos juntos,
saciar essa fome
grande da saudade
de sermos nós mesmos.

anônimo

minha voz mais forte
soa dentro de mim

por mais que eu grite
ocupo tão pouco espaço

queimo menos que
a chama que esquenta
meu almoço

o que sou pros outros
só importa
    a mim
    não me importa
    nada

por ser muitos não
sou ninguém

heterônimo

quem é esse
que vive minha vida em piloto automático?

que não tem consciência ou memória
há tantos anos
me sinto

    de repente
tão cheio de culpa
          de tristeza

se é esse quem eu sou
quem é esse
    que assina meus papéis
        se finge de feliz

    que engana a todos
        fecha meus olhos
        e me tortura

        ao deixar que eu viva
        três horas
        da madrugada

homônimo

outro dia, meus amigos disseram que
eu sempre serei fernando pessoa

a princípio
   levei como um elogio
   aos meus poemas
   sabendo que estou longe de chegar lá

depois
   como um insulto
   ao meu recolhimento
      minha introspecção
      minha troca de faces

por fim
    como um acerto

        quem é esse que vive minha vida
        e tranca a minha porta?

ansiolítico

para toda a pressão
do por vir
dessa manhã escura
sem vontade
brincas com pílulas
de conversas
prometes tua imagem
bem borrada
entre um café e outro
pão na chapa